Eis o teor da carta com o estranho caso:
“O caso é o seguinte: tinha Vasco Fernandes, nosso principal, um filho por nome Manemuacu, o qual estava muito doente na aldeia da Vila. Estando ele assim, uma noite de grande tempestade o tomaram os demônios em corpo e com grande estrondo o levaram, arrastando e maltratando.
“O padre Braz Lumenso o foi consolar (ao pai de Manemuacu), dando-lhe a esperança que, se não morto, que lhe apareceria, como de feito daí a três dias apareceu…O pobre índio contava que, depois de havê-lo posto no porto de João Ramalho, o levaram a Santo Antônio com tanto ímpeto e clamor que a si mesmo não podia ouvir nem entender; daqui o puseram no porto de Jaravaia e por concluir, diz que o puseram entre muitos outros, onde se fizeram muito mal.
Aqui viu muitos fogos e mui horíveis. Finalmente, depois de todos esses martírios, o arrojaram entre uns mangues onde se maltratara muito e ficara fora de si com tantos tormentos como passara, que por isso não conhecia os seus quando deram sobre ele e fugiu deles como se foram demônios. Tudo isso permitiu o Senhor para que venham o conhecimento da sua lei, considerando perverso o domínio do Demônio.”
Algumas coisas nos chamam a atenção no episódio fantástico narrado na carta do Padre Sá. O estrondo, no ato do rapto; o rápido deslocamento do índio de porto a porto,…com tanto ímpeto e clamor que a si mesmo não podia ouvir nem entender…E também os …muitos fogos e mui horríveis…Parece que o índio não era o único raptado, pois …o puseram entre muitos outros…
Não deixa de ser curioso este caso. Nunca é demais lembrar que o mesmo ocorreu em 1559 e a linguagem sobre qualquer fenômeno grotesco necessariamente incluiria o Demônio.