Talvez seja uma boa oportunidade para falar que diabos afinal acontece em Júpiter para deixá-lo todo manchado. Para começar, Júpiter é grande, muito grande: 143 mil quilômetros de diâmetro, cerca de 12 vezes o terrestre (só na Grande Mancha Vermelha dá para acomodar umas três Terras). Além disso, o planeta é todo feito de gás –um enorme cobertor composto principalmente por hidrogênio e hélio (não por acaso os elementos mais abundantes do Universo). Tudo isso se resume em sua categoria: gigante gasoso.
Pois bem. Se nosso modesto planeta, com uma atmosfera com umas poucas dezenas de quilômetros de altura, já tem uma dinâmica tão complicada (de deixar malucos os pobres meteorologistas e climatologistas que buscam criar modelos de longo prazo do comportamento das camadas de ar), imagine um mundo feito praticamente todo de atmosfera, com uma gravidade muito mais intensa? Bem-vindo a Júpiter, amigo.
Dinâmica da atmosfera de Júpiter, vista pela Cassini Resultado: clima de Itu. A Grande Mancha Vermelha, por exemplo, já é observada desde 1665 e não pretende ir a lugar nenhum tão cedo. É um redemoinho gigante e turbulento, com fluxos que atingem velocidades de 500 km/h. É para colocar furacão terrestre no chinelo. Alguma alteração química, associada à chegada de material na alta atmosfera joviana, produz a cor vermelha –mas ninguém sabe explicar como.
O surgimento da Red Jr. é uma grande oportunidade para estudar como isso tudo acontece, embora ninguém tenha a garantia de que a irmã menor tenha vindo para ficar. Os astrônomos terão de ficar de olho nos próximos meses e anos, para monitorar a evolução da Oval BA. E o legal é que a oportunidade não está fechada aos profissionais.
Dulcidio Braz Jr. Imagens de astrônomos amadores filipino e brasileiro revelam nova manchaEm seu anúncio, a Nasa destacou a fotografia obtida por um astrônomo amador filipino, chamado Christopher Go, para exibir a nova mancha vermelha. Mal sabia a agência espacial americana que o brasileiro Darío Pires, 62, astrônomo amador de Araraquara (interior de São Paulo), alguns dias antes, já havia flagrado o surgimento de Red Jr.
Pires, como me disse o físico Dulcidio Braz Jr., do blog Física na Veia, é uma espécie de “Professor Pardal” da astronomia amadora. Ele mesmo constrói seus telescópios, usa uma webcam improvisada acoplada ao dito cujo para obter as fotografias e adaptou um mecanismo de impressora para mover o telescópio de modo a acompanhar o movimento da Terra. Ainda assim, suas imagens rivalizam em qualidade com as que são obtidas com equipamentos industriais.
“Confecciono telescópios, óptica e mecânica, somente sob encomenda, juntamente com meu filho Jaime Pires”, diz Darío. “Faz mais ou menos uns 20 anos que faço isso, mais por hobby do que por comércio. Aprendi com livros antigos e o meu método de trabalho na óptica é baseado no livro de Jean Texereau, “La Construction du Télescope d’Amateur”, da Societé Astronomique de France, 1956, e em vários outros livros italianos e americanos, porque no Brasil não existe literatura para isso.”
Para o astrônomo amador brasileiro, foi uma surpresa encontrar a Red Jr. em suas imagens. “Apenas notei quando um astrônomo, amigo meu, mandou um e-mail comentando”, diz. “Sempre tiro fotos de Júpiter, embora meu planeta preferido seja Saturno!”
Eventos como o surgimento da Red Jr. e exemplos como o de Darío Pires são fascinantes sobretudo porque mostram uma grande verdade sobre o cosmos e seus mistérios –eles estão abertos a quem quer que se interesse por eles. Basta olhar para cima.
Salvador Nogueira, 26, é repórter de Ciência da Folha e autor de “Rumo ao Infinito: Passado e Futuro da Aventura Humana na Conquista do Espaço”.